A provocação chegou-me por mail. Uma pessoa pensa que está a salvo destes acidentes e não. Uma pergunta pica-nos no ecrã, como ferroada de melga.
Eu ia à procura de abraços, de saudades, de notícias de fins de semana na praia e pronto! Uma estocada na minha incultura.
24 de Junho - há-de ser feriado em terras apadrinhadas por S. João - o santo mais folião, ainda quase resmunguei, a mostrar-lhe bem relacionada com o dia. Penso que este não será o padroeiro cigano. É certo que a alma dos dois comunga da mesma fome de festejar a vida, só que o S. João é mais gaiteiro, mais rapioqueiro. O cigano é mais aficionado, maias vaidosamente sensual.
Não, o leitor não tinha nada que saber da importância deste dia para a cultura cigana. Primeiro, porque os dias mundiais proliferam como borbulha em cara de adolescente, depois porque o nosso conhecimento sobre a etnia cinge-se mais a um relatório circunstanciado de actividades ilícitas. Mas eu, não. Eu tinha obrigação de saber. Vou liderar uma delegação de jovens portugueses, ciganos e não-ciganos, num encontro internacional e multicultural, a decorrer de 1 a 7 de Julho, em Praga, promovido pela organização Saga Cigana Slovo 21! É certo que já pesquisei, já rascunhei unstextos, já coloquiei com jovens sobre a importância do conhecimento do outro, do diferente, já nos auto.analisámos em questões de tolerancia, mas não me restam dúvidas que aind atenho muitas dúvidas. Vamos ter uma semana para aprofundar conhecimentos. vamos saber que mais da História Universal desta etnia, vamos aprender algumas palavras de romani, vamos espreitar arte e literatura ciganas, ouvir pedagogos especialistas em falar de sociologia, religião, gestão de conflitos inter-étnicos e dependências, vamos ter cobertura da televisão checa! Mas nem só de cultura da mente vive este encontro. De tarde haverá actividades desportivas. Aqui espero encontrar uma modalidade à minha pequena altura. E estamos particularmente sensibilizados para os serões interculturais. Isto, claro, não exclui a nossa ânsia de conhecer Praga, a cidade de Dvorak, de Kafka, da Primavera, de Vac Lav Havel, da ponte entre o leste e o oeste, de um lugar eternamente de passagem. Comigo vão Raquel Ribeiro e Francisco Gomes (dois artistas do Andamento da d'Orfeu, (e João Cabeça e Adérito Montes (dois jovens ciganos, estudantes, construtores e tocadores de guitarra das Oficinas Romani de Lisboa).
Realiza-se apresentações culturais dos países intervenientes. Estamos já a preparar a nossa. Mas não adiantemos mais informações, não vão os nossos colegas franceses, húngaros, checos polacos, eslovenos e outros, ler os nossos jornais e clonarem-nos as ideias. Mas que levo arte, isso eu garanto. Águeda não vai ficar envergonhada. Eu depois conto. Se se interessarem por saber!
Os meus dois acompanhantes de Lisboa já vieram visitar-nos, a nosso convite. É assim que se vão esbatendo alguns preconceitos. Se vissem como eles agarram na guitarra, como a dominam, como a vergam, como lhes arrancam a alma, ficavam assim como eu, à espera que me fechassem a boca.
Como fiquei, quando abri o meu correio electrónico e vi a pancadinha bem intencionada, nas costas da minha incultura.
Hoje é o Dia Mundial Cigano, sabia?
Odete Ferreira
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